por Joaquim Maia Neto
Imperialismo é o termo utilizado para denominar a política de expansão e domínio territorial, econômico e cultural de uma nação sobre outra, geralmente de uma nação poderosa sobre uma mais pobre. No presente artigo, utilizo o termo no sentido amplo, abrangendo o que se denomina “colonialismo”. O colonialismo é uma espécie de imperialismo que implica o controle político da nação dominada, envolvendo a anexação do território e a perda de soberania. O imperialismo que predomina atualmente no mundo não é o colonialismo, porque se fundamenta principalmente no domínio econômico e cultural, atuando de maneira mais discreta.
Diversos países atuais são ou foram imperialistas em algum momento de sua história. Alemanha, Bélgica, Espanha, Estados Unidos, França, Itália, Japão, Países Baixos, Portugal, Reino Unido e Rússia adotaram essa prática política para expandir seu poderio econômico. O Império Otomano, dissolvido na década de 1920 após a derrota na Primeira Guerra Mundial, é um exemplo recente de nação imperialista que, após grande expansão, declinou drasticamente, restando hoje apenas seu núcleo político-geográfico que foi transformado na República da Turquia. Há ainda o Estado de Israel, que apesar de não ser considerado um estado imperialista, desempenha um papel de “ponta-lança” do imperialismo anglo-americano no Oriente Médio. A prática imperialista foi justificada ao longo do tempo com base em teorias etnocêntricas, doutrinas religiosas e até mesmo no “Darwinismo Social” uma deturpação da teoria evolutiva proposta por Darwin e Wallace.
O Brasil que conhecemos hoje foi em grande medida formado a partir das políticas imperialistas empreendidas pelos países europeus com as grandes navegações do final do século XV e início do século XVI.
Os ímpetos imperialistas sempre tiveram uma estreita relação com os recursos naturais. Não há notícia de qualquer iniciativa de expansão sobre outras nações que não tivesse como pano de fundo a apoderação sobre bens de origem natural, incluindo o próprio homem, que até no passado recente era capturado nas nações africanas para ser vendido como mercadoria destinada ao trabalho escravo nas Américas e na Europa.
O território é o mais elementar dos recursos naturais a despertar ambições colonialistas. A partir da aquisição do território, todos os demais recursos associados a ele poderiam ser explorados com maior tranquilidade. No Brasil, a conquista do território pela Coroa Portuguesa levou à exploração principalmente dos recursos florestais e minerais.
As maiores vítimas da expansão imperialista no mundo foram as nações da América Latina, Ásia e África, sendo este último continente objeto do chamado neocolonialismo com a partilha do seu território entre as potências europeias no final do século XIX até o início do século XX. A partilha da África trouxe consequências desastrosas para a população, mesmo depois da descolonização dos países africanos. Após a independência, a delimitação territorial de cada país obedeceu aos limites estabelecidos quando da partilha entre os europeus. Esses limites muitas vezes separavam tribos unitárias ou juntavam tribos distintas sob o mesmo território, o que provocou desagregação social e causou vários conflitos.
Durante a Guerra Fria (1949 a 1990) a bipolarização entre os blocos capitalista, capitaneado pelos EUA, e socialista, liderado pela União das Repúblicas Socialistas Soviéticas, levou a um imperialismo que, além de ter como objetivo a obtenção de novos territórios e seus recursos naturais, também tinha interesse na influência política que esses blocos poderiam desempenhar sob as demais nações a fim de se fortalecerem no jogo de força e poder que provocou a divisão do mundo. Até mesmo uma corrida espacial foi empreendida, fruto da competição entre as duas superpotências. No período, a América do Sul foi alvo da intervenção dos EUA. As ditaduras militares instaladas em vários países, inclusive no Brasil, foram planejadas e executadas com forte participação da Casa Branca, sob a desculpa de proteger o mundo da ameaça comunista, personificada nos movimentos de esquerda que lutavam contra a exploração econômica que impedia o desenvolvimento do continente. Nada mal para um país que se orgulha de pregar a democracia.
O recurso natural que atualmente mais desperta interesses imperialistas é o petróleo. Devido ao modelo energético predominante no mundo, baseado na queima de hidrocarbonetos, o domínio sobre o “ouro-negro” tornou-se estratégico, em especial para os países industrializados. A partir da primeira fase da crise do petróleo, desencadeada em 1956, quando o Egito nacionalizou o Canal de Suez, as principais potências industriais passaram a traçar planos no sentido de ter facilitado o acesso ao petróleo, seja por ações comerciais e diplomáticas, ou por interferências políticas, econômicas, sociais e bélicas.
O Oriente Médio e o norte da África sempre foram alvo de ambições de países dependentes de petróleo. A partir da década de 1950, EUA e União Soviética disputaram poder na região. Com o fim da Guerra Fria a bipolarização ruiu e instaurou-se no mundo a hegemonia estadunidense apoiada por seus aliados, como Reino Unido e Israel. Israel, além de ser um aliado imprescindível aos interesses dos EUA, também tem influência sobre as decisões da Casa Branca devido ao forte poder econômico da comunidade judaica na economia norte-americana.
Atualmente as estratégias do imperialismo estadunidense são mais complexas. A simples ocupação de um território estrangeiro para tomar seus recursos naturais ou o financiamento de governos autoritários de direita não são ações toleradas pela opinião pública internacional e por isso foi necessário criar os “ditadores da vez” e disseminar a ideia da “guerra contra o terror”, para tornar aceitáveis as intervenções militares dos EUA. Muitas vezes os ditadores ou terroristas são “crias” dos próprios EUA, como Saddam Hussein, apoiado pela Casa Branca na guerra contra o Irã, e Osama Bin Laden, financiado pelos estadunidenses para o combate às tropas soviéticas durante a invasão do Afeganistão nos anos 80. A estratégia do Tio Sam é fomentar e potencializar divergências econômicas, étnicas ou religiosas nas sociedades dos países sobre os quais tem interesse econômico, causando instabilidade e conflito. Com o caos instalado, fica fácil pregar o discurso da necessidade de intervenção bélica, visando resguardar as populações atingidas e prestar apoio “humanitário”. Para isso os EUA dispõem de diversos instrumentos eficazes para o alcance de seus objetivos: o controle da ONU e da OTAN; o terrorismo de Estado, executado pela própria Casa Branca e por Israel; a utilização do seu serviço de inteligência a favor de facções aliadas; o financiamento e apoio a milícias, grupos paramilitares, mercenários e traficantes de armas; além de sua bem estruturada máquina de propaganda, que inclui instrumentos culturais, como o cinema e a música.
É interessante notar que a preocupação humanitária estadunidense só é despertada contra nações não alinhadas com seus interesses. As ditaduras da Arábia Saudita e do Bahrein, além da egípcia, que vigorou até a saída de Mubarak, nunca foram contestadas pelos EUA, pois esses países sempre foram aliados da Casa Branca. Já Irã, Iraque, Líbano, Síria, Somália e Sudão recebem tratamento diferente e estão no plano intervencionista estadunidense. Coincidentemente estes países são produtores de petróleo e, no caso dos asiáticos, contrários às políticas do governo sionista. O discurso de proteção aos direitos humanos, tão fortemente utilizado para manter o embargo econômico a Cuba, não se sustenta diante da constatação de que os EUA são grandes violadores desses direitos, como já é notório no que diz respeito ao tratamento dado aos prisioneiros de Guantánamo. Recentemente os norte-americanos admitiram ter usado técnicas de tortura para obter informações sobre o paradeiro de Bin Laden. Curioso também é o fato de que a OTAN, com apoio dos EUA, está destruindo a Líbia, um país produtor de petróleo com altíssimos índices de desenvolvimento humano e qualidade de vida da população, mas fechou os olhos durante anos às atrocidades cometidas em Serra Leoa na década de 90, causadas pela exploração criminosa de diamantes, outro recurso natural, que embelezou dedos e pescoços nos Estados Unidos e no Reino Unido. O massacre que Israel impõe há anos ao povo palestino, incluindo a ocupação de territórios árabes, também não é foco da atuação humanitária da ONU ou da OTAN.
Muitos governantes que permanecem por longo tempo no poder em governos acusados de corrupção são tratados com honrarias pela Casa Branca, como foi o caso Mubarak no Egito e muito recentemente na recepção do presidente do Gabão por Barack Obama. O presidente dos EUA era uma esperança de mudança de postura em relação àquela adotada por seu antecessor, George W. Bush. Prometeu desativar Guantánamo e adotou um discurso que priorizava o diálogo e a tolerância ao invés de intervenções bélicas. Pregou uma maior reponsabilidade ambiental e reformas sociais. Ganhou o Prêmio Nobel da Paz por defender o desmantelamento dos arsenais nucleares, mas seus discursos não resistiram à possibilidade de não ser reeleito e Obama, desgastado pela crise econômica, cedeu às pressões de uma sociedade doutrinada pelo etnocentrismo e sedenta de vingança. Algumas reformas sociais foram feitas, mas a política externa mudou muito pouco. Para reaver os bons índices de popularidade que teve no início do governo, Obama prosseguiu com a “Guerra contra o Terror”. Em 1º de maio deste ano, violou a soberania do Paquistão, invadindo seu território, e assassinou um Bin Laden rendido, diante de sua filha, num episódio digno das barbáries da idade média. Por mais facínora que fosse o líder da Al-Qaeda, deveria ter sido capturado e julgado por seus crimes. O anúncio triunfal de sua morte por Obama, como quem ergue um troféu, e a comemoração da população estadunidense nas ruas, são episódios dignos de se lamentar.
As intervenções bélicas imperialistas não destroem apenas nações e cidades. Diversas espécies são dizimadas pelos bombardeios e ecossistemas inteiros, muitas vezes frágeis e raros, são completamente destruídos sem que nenhuma notícia sobre isso seja dada na mídia. Nem mesmo unidades de conservação e sítios históricos e arqueológicos são poupados.
O fortalecimento do BRICS, bloco de países emergentes formado por Brasil, Rússia, Índia, China e África do Sul é um fator importante para o reequilíbrio mundial, eliminado com a queda do Muro de Berlim. Na América do Sul, Hugo Chávez, presidente da Venezuela eleito em 1998, foi o primeiro chefe de estado, após a guinada neoliberal do continente, a fazer um discurso duro contra o imperialismo estadunidense, porém sua influência foi muito menor que a de Lula, eleito em 2002, que apesar de ter um discurso bem mais moderado e de não romper com as bases econômicas do governo anterior, conseguiu disseminar a ideia de que seria possível a ascensão da esquerda ao poder sem que isso implicasse desestabilização econômica. De fato, a eleição de Lula foi fator catalisador da eleição de outros governos esquerdistas na América do Sul, como Evo Morales, na Bolívia, Rafael Correa, no Equador e José Mujica, no Uruguai. A recente eleição de Ollanta Humala, no Peru, contou com o assessoramento de militantes petistas. A atual conjuntura sul-americana torna o continente cada vez mais independente da influência imperialista, garantindo avanços sociais.
Se por um lado o Brasil se consolida como liderança emergente no cenário internacional e ajuda a contrapor a hegemonia norte-americana, por outro, não se livrou das vinculações aos interesses econômicos privados internos, que continuam imbricados com o Estado por meio do financiamento de campanhas eleitorais, dos contratos com a administração pública e dos lobbies junto aos poderes constituídos. As relações entre o Estado e os agentes do capitalismo nacional, estão conduzindo o país a um desenvolvimentismo ambientalmente irresponsável e insustentável. O PAC, da forma como vem sendo imposto, é o exemplo mais claro dessa postura adotada pelo Brasil. A destruição e o esgotamento dos recursos naturais causada pela política desenvolvimentista, além de retirar do país a possibilidade de se desenvolver em bases muito mais sólidas com a exploração sustentável dos recursos da biodiversidade, que são o grande diferencial do país em relação às demais nações, viabiliza o discurso imperialista de que não sabemos cuidar desse importante “patrimônio da humanidade”.
As mudanças climáticas, mais cedo ou mais tarde, obrigarão os países industrializados a mudar o rumo de suas políticas energéticas para o estabelecimento de fontes geradoras mais limpas. Os EUA e a Europa já se preparam para ampliar drasticamente a participação da energia termossolar nas suas matrizes energéticas. O petróleo perderá importância e deixará de ser o principal motivador da expansão imperialista. A diversidade biológica e os recursos hídricos serão a bola da vez. Os interesses internacionais já estão voltados para esses recursos e para o Brasil, que ainda os detém em abundância. Degradar a natureza não é uma boa estratégia para o país. Fazendo isso, perdermos oportunidades econômicas e facilitaremos a estratégia de se criar o “inimigo da vez”, que neste caso será o conjunto dos sul-americanos destruidores da floresta. E os “guardiões do mundo” encontrarão aqui uma nova Líbia. O tamanho da nossa economia ainda é o que nos livra disso, pois diversas empresas transnacionais tem no Brasil uma considerável fatia do seu mercado. Mas quando a água estiver ainda mais escassa, não haverá mercado que segure o império. Seria mais inteligente priorizarmos a conservação ambiental e continuar lutando por um mundo cada vez menos alinhado com o Tio Sam.
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