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domingo, 28 de agosto de 2011

Limpa Brasil

Por Joaquim Maia Neto
Ontem foi comemorado o “Dia da Limpeza Urbana”. Acredito que pouca gente sabe que esse dia existe. Muitas pessoas devem achar que é mais um dia inventado por algum político que, ao invés de apresentar proposituras para melhorar a vida da população, fica inventando datas comemorativas. Em todos os dias deveríamos ter a preocupação com a limpeza urbana, mas uma data no calendário ajuda a refletir sobre o assunto, que não é banal, ao contrário, deveria ser tratado como prioridade.
Dados da ABRELPE – Associação Brasileira de Empresas de Limpeza Pública e Resíduos Especiais - mostram que a quantidade de resíduos sólidos urbanos gerados no Brasil em 2010 foi 6,8% superior à de 2009. O aumento foi seis vezes maior que o crescimento populacional registrado no mesmo período, o que significa que a produção de resíduos de cada brasileiro está aumentando muito. Em 2010 cada morador do país produziu sozinho, em média, 378 Kg de lixo, mais de cinco vezes o peso de uma pessoa de 70 Kg! A quantidade de resíduos sólidos urbanos com disposição inadequada, ou seja, destinados a lixões ou aterros controlados (não adequados) passou de 21,7 milhões de toneladas em 2009 para 23 milhões de toneladas em 2010. 
A região campeã em má gestão de resíduos é a centro-oeste, com 71% de disposição inadequada, seguida do Nordeste, com 66%, Norte (65%), Sul (30,3%) e Sudeste (28,3%). Esta última região é a que mais produz resíduos sólidos urbanos, sendo os estados de São Paulo e Rio de Janeiro os maiores produtores de lixo, com 55 mil e 20 mil toneladas diárias, respectivamente.
Entende-se por disposição adequada de resíduos sólidos, o cenário no qual o lixo é depositado em aterros sanitários adequados, que possuem impermeabilização que impede a contaminação do lençol freático e do solo adjacente e que estão licenciados pelo órgão ou entidade ambiental competente. Além dos impactos de contaminação, a decomposição do lixo produz metano (CH4), um dos gases que mais contribui com o efeito estufa. A disposição adequada de resíduos em aterros sanitários não elimina a produção de metano, também chamado “biogás”, motivo pelo qual a redução na geração de lixo é fundamental para reduzir o impacto causado ao planeta. De acordo com estudo recente do Banco Mundial¹, o cenário ideal para redução de emissões de carbono oriundas de resíduos seria a queima do metano, com 75% de eficiência de coleta, em 100% dos aterros. A combustão completa desse gás gera dióxido de carbono (CO2), que contribui menos do que o metano para o aquecimento global. Outras ações, como a compostagem aeróbia doméstica dos resíduos orgânicos, que não gera metano, também são importantes. Hoje em dia, no Brasil, uma parcela pequena do biogás gerado pelos resíduos é queimada.
Além da disposição dos resíduos coletados, outro grave problema comum no país é o hábito de se jogar lixo na rua. No domingo passado participei do movimento “Limpa Brasil! Let’s do it!” e juntamente com minha família, tornei-me um catador de resíduos por um dia. O movimento é uma iniciativa de empresários brasileiros em cooperação com a UNESCO, patrocinado por grandes empresas. Na realidade os organizadores trouxeram para o Brasil uma ação que começou na Estônia e já aconteceu em quase vinte países, entre os quais estão Finlândia, Índia, Portugal e Ucrânia. Consiste em instar as pessoas a recolher o lixo que está espalhado em sua cidade, aquele que é inadequadamente jogado nas ruas. No Brasil já foram realizadas as campanhas de Brasília e do Rio de Janeiro. Neste final de semana a ação está acontecendo em Goiânia e ainda estão agendados mutirões de limpeza em Belo Horizonte, Campinas, Guarulhos e São Paulo.
Por mais que saibamos que o problema existe, passar um dia catando lixo é uma experiência extremamente enriquecedora. Nas horas em que fiquei trabalhando nessa missão, percebi as reações das pessoas que nos viam naquele trabalho. Alguns envergonhados por não estarem participando, outros se juntaram a nós e houve aqueles que olhavam com indiferença ou com asco. Mas a maior reflexão foi sobre o que catávamos. O Plano Piloto de Brasília parece uma cidade limpa, mas não é. Como é bem vegetada, o lixo fica escondido entre as árvores e gramados. O problema é mais de educação do que de gestão de resíduos. Fiquei impressionado com a quantidade de papéis de bala e de filtros e embalagens de cigarros. Os consumidores desses produtos são, em geral, muito mal educados. Parece que a regra é jogar no chão. As pessoas não conseguem esperar para jogar o papel quando encontrarem uma lixeira. Não podem colocar a pequena embalagem no bolso. Tampouco podem apagar o toco do cigarro e depositá-lo adequadamente. Sequer sabem, ou se sabem não se importam, sobre o tempo de decomposição de seu resíduo.
Outra coisa impressionante foi a quantidade de embalagens descartáveis dos restaurantes fast food. Essas grandes redes de franquias devem ser responsabilizadas economicamente por seus resíduos, pois lucram com a venda de seus produtos e deixam o ônus da imundície com a sociedade, inclusive com aqueles que não são seus clientes. Num gramado, em volta de um desses restaurantes, era impossível não pisar no lixo, devidamente identificado com a logomarca da franquia. Acabei me convencendo de que essas redes são inimigas do meio ambiente. Copo de plástico, tampa de plástico, canudo, embalagem de sanduíche, até o guardanapo é embalado em plástico. As pessoas, depois de consumir, acreditam que existe uma magia universal que faz aquele monte de resíduos desaparecer milagrosamente. Afastar o lixo dos olhos é suficiente para ter a sensação de que aquilo não existe mais.
Fiquei imaginando o que pensam os profissionais da limpeza urbana, ou aqueles catadores autônomos que tiram seu sustento do que não nos serve mais. São pessoas simples que muitas vezes não têm acesso ao consumo que gera os resíduos que coletam. Devemos valorizar muito essa gente. Depois da catação passei a dar ainda mais importância ao seu trabalho. Esses trabalhadores mitigam, com seu suor, o impacto de uma multidão de irresponsáveis abastados tidos como pessoas mais importantes do que eles.
Além de tudo o que observamos, foi triste ver fezes de cachorros espalhadas por todos os lados, oriundas de animais que passeiam com seus donos, já que em Brasília praticamente não há cães vadios. A maioria não cumpre a legislação que obriga catar a caca que os animaizinhos produzem confortavelmente fora dos caríssimos apartamentos das superquadras.
O “Limpa Brasil” não vai resolver diretamente o problema da sujeira das cidades brasileiras com as ações pontuais de catação, mas é um importante instrumento de reflexão, marketing e educação para a mudança do nosso comportamento.
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1. ALVES, J. W. S. & C. DE GOUVELLO (Coord.). Estudo de Baixo Carbono para o Brasil – Relatório de Síntese Técnica – Resíduos. O Banco Internacional para Reconstrução e Desenvolvimento / Banco Mundial. 2010. 112 pp. (disponível em http://www.esmap.org/esmap/sites/esmap.org/files/Waste_Portuguese_final_09-12.pdf)

2 comentários:

  1. "Esses trabalhadores mitigam, com seu suor, o impacto de uma multidão de irresponsáveis abastados tidos como pessoas mais importantes do que eles." Quem dera pudéssemos entender humanamente a importância desses trabalhadores em um ciclo social viciado na sujeira e no pouco caso com o lixo produzido. Parabéns pelo artigo e pela lembrança do “Dia da Limpeza Urbana”. Voc~e realmente faz a diferença.

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  2. Neto, segue meu blog: http://descascandolaranjas.blogspot.com/

    tentarei postar algo vez por outra. se for possível, divulgue.
    Grande abraço, Cintia Chagas

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