Por Joaquim Maia Neto
As discussões sobre a reforma do Código Florestal e a proteção das florestas definitivamente se consolidaram como um dos temas mais importantes na atualidade. Isso é bom. O Brasil, que é uma das nações mais bem dotadas do mundo no quesito biodiversidade não pode prescindir desse debate, que é estratégico para nosso futuro enquanto nação. Não obstante o tema ganhe projeção, com pautas diárias nos meios de comunicação de massa, e torne-se assunto comum nas mais diversas rodas, a condução dos debates não é a mais adequada. Está havendo uma polarização, entre o “agro” e o ambiental, que tenta transmitir uma imagem falaciosa à sociedade de que agricultura e conservação ambiental são áreas que se contrapõem.
A tônica do movimento tem chegado às discussões no Senado, que acabou de aprovar a reforma do Código na Comissão de Constituição e Justiça, cujo relator, o senador Luiz Henrique (PMDB-SC), é o mesmo que, quando governador de Santa Catarina, sancionou uma Lei estadual que reduzia consideravelmente a proteção florestal em relação à legislação federal, o que é ilegal. O mesmo senador será ainda o relator nas comissões de Ciência e Tecnologia e de Agricultura e Reforma Agrária.
Por outro lado, diversos estudos e manifestações de juristas, ambientalistas, comunidade acadêmica e pequenos produtores rurais têm sido produzidos e trazem luz ao debate. O mais recente estudo foi publicado na revista Nature, nesta semana e demonstra que as florestas primárias nunca mais chegam a sua condição original após a intervenção humana, mesmo que sejam conduzidas técnicas de recomposição. Segundo a publicação, as florestas tropicais da América do Sul têm um índice de alteração de 44%, muito superior às do México e América Central (10%), onde a exploração do turismo sustentável tem garantido um impacto menor.
Os interesses da agricultura (que não são necessariamente os dos “agros”) não são opostos aos da conservação, por um motivo muito simples: não há agricultura sem conservação. A agricultura depende de água, de estabilidade climática, de solos conservados, de polinizadores, de ecossistemas em equilíbrio. Avançar no desmatamento, como ocorrerá caso seja aprovado o “novo Código”, é um tiro no pé da agricultura brasileira. O que os mentores do movimento Agro estão defendendo, não é a agricultura, mas sim o dinheiro. Querem lucrar rapidamente a qualquer custo. Recente estudo do INPE em parceria com a Embrapa mostra que dois terços dos 18% do bioma amazônico que já foram desmatados são ocupados por pecuária de baixíssima produtividade. A lógica predominante é a de investir pouco e ter retorno na expansão das áreas. A produção agrícola ocupa apenas 5% das áreas desmatadas da Amazônia. Estes números mostram que o Brasil não precisa desmatar mais para aumentar a produção de alimentos, basta utilizar melhor as áreas já abertas.

Enquanto os pequenos produtores que nos alimentam diversificam a produção para atender à demanda interna, os “agros” plantam monoculturas mecanizadas altamente envenenadas que causam grandes impactos ambientais. Se dependêssemos deles, comeríamos apenas soja, cana e carne bovina.

Outro exemplo recente de ataque à conservação ambiental foi o discurso do deputado Reinhold Stephanes (PMDB-PR) proferido em um seminário sobre hidrovias. Em meio às discussões sobre as vantagens, principalmente ambientais, do modal de transportes hidroviário, o ex-ministro da agricultura destilou um forte pessimismo, afirmando que as hidrovias jamais iriam integrar a região norte ao restante do país devido à “barreira ao desenvolvimento” representada pelo conjunto de unidades de conservação recentemente criadas no “arco do desmatamento” entre o norte de Rondônia e Mato Grosso e o sul do Amazonas e Pará. As unidades de conservação não impedem as hidrovias nem o desenvolvimento. Elas impedem sim o desmatamento e o lucro fácil e irresponsável dos “agros”. Mas estes preferem distorcer os fatos para angariar apoiadores incautos à sua causa.
O Senado ainda tem a chance de agir com responsabilidade entendendo a grandeza de seu papel diante de um tema de tamanha relevância ao país. Cabe à sociedade acompanhar seus representantes e cobrar uma discussão em bases técnicas e científicas deixando a guerra de marketing em segundo plano. Precisamos ouvir quem estuda o assunto com seriedade. A Giovanna Antonelli e o Lima Duarte que me perdoem, mas não sabem do que estão falando, porém falam mesmo assim porque o cachê compensa.
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