Por Joaquim Maia Neto
Na última quarta-feira, dia 12, dia da Padroeira do Brasil e das crianças, diversas cidades brasileiras transformaram-se em palco para grandes manifestações de cidadania: as marchas contra a corrupção. O “Movimento Contra a Corrupção”, que já está organizado em quinze estados, contou com a força das redes sociais para mobilizar a sociedade, mas não se restringiu a elas. Sabendo que as manifestações presenciais são muito mais eficazes na sensibilização da opinião pública e dos poderes constituídos, o Movimento está combinando, de maneira inteligente, a capilaridade da comunicação eletrônica com o poder contagiante das grandes marchas, resultando num envolvimento popular como há muito não se via.
Em Brasília a marcha foi extremamente bem organizada. Pacífica, contou com a participação predominante de jovens entre as vinte mil pessoas que encheram a Esplanada dos Ministérios, mas também havia muitas famílias com crianças e idosos. Trabalhadores, estudantes, aposentados, representantes de minorias, uma grande parcela da sociedade estava representada. A presença do presidente do Conselho Federal da Ordem dos Advogados do Brasil, Ophir Cavalcante, que defendeu em seu discurso o Conselho Nacional de Justiça (CNJ), deu ainda mais peso à marcha.
Presidente da OAB, Ophir Cavalcante, discursa durante a Marcha |
Muitas características do movimento e das marchas levam a uma expectativa otimista quanto à percepção crítica da sociedade sobre a política. A presença maciça de jovens nos mostra que, ao contrário do que ocorrera no passado próximo, o jovem volta a se interessar por política e de uma maneira bastante positiva, engajando-se nela e exigindo dos Três Poderes uma postura ética com a coisa pública. A predominância da juventude nos traz um alento quanto ao futuro. Outro ponto interessante é a ausência de personificação do movimento. Não houve uma figura de destaque que pudesse gerar suspeita sobre interesses individuais ou de grupos. A organização do movimento é plural, com atribuições bem divididas entre os membros. Percebi que no atendimento à imprensa, vários organizadores deram entrevistas aos diversos veículos de comunicação, sempre buscando que os holofotes iluminassem o movimento e não as pessoas. Sem caráter partidário, a marcha esteve livre para criticar construtivamente as falhas éticas existentes nos poderes executivo, legislativo e judiciário.
Os três eixos principais defendidos durante as marchas são assuntos de extrema importância para a moralização da máquina pública: A defesa do CNJ, em especial da competência de sua corregedoria para julgar desvios disciplinares de juízes independentemente da apuração por parte das corregedorias dos tribunais; a implementação da Lei da Ficha Limpa e; a abolição do voto secreto no parlamento. A grande adesão ao movimento mostra que as pessoas estão compreendendo a importância dos temas e exigem uma drástica mudança nos costumes políticos do país.
Os três pontos são igualmente importantes, mas o envolvimento da sociedade na defesa do CNJ é imprescindível. O Poder Judiciário, ao contrário dos demais, não passa pelo crivo das urnas e, portanto, os cidadãos não dispõem do poder que têm sobre o executivo e o legislativo, de barrar, com seu voto, maus representantes a cada eleição periódica. Como em todos os poderes e em todos os segmentos da sociedade, existem maus juízes, corruptos, bandidos de toga, como bem disse a ilustre ministra Eliana Calmon, e não podemos admitir que sejam contemplados com a impunidade devido ao corporativismo existente nos tribunais.
A Lei da Ficha limpa terá sua constitucionalidade julgada provavelmente ainda neste mês pelo Supremo Tribunal Federal. Ao impedir que políticos condenados por um tribunal se candidatem a cargos eletivos, a Lei retiraria dos corruptos a possibilidade de continuar a surrupiar o dinheiro que deveria servir à população. É evidente que a própria sociedade pode aplicar o conceito de ficha limpa sem a necessidade de Lei, informando-se sobre o passado do candidato e não votando naqueles que são condenados. Mas num país como o nosso, onde a maioria da população não tem o hábito de se informar sobre os detalhes da atividade política, a Lei é mais do que necessária. Já a extinção do voto secreto, além de garantir um direito óbvio ao eleitor, de saber como se comporta o seu representante, permitiria distinguir entre os parlamentares, aqueles que são comprometidos com a bandidagem daqueles que respeitam seus eleitores e votam de acordo com o interesse público.
Por mais descomprometida que seja a maioria dos nossos parlamentares com as questões éticas, o medo de perder votos é uma grande motivação para que senadores, deputados e vereadores votem de acordo com o que deseja a sociedade. Isso ficou explícito na votação da Lei da Ficha Limpa no Congresso. Neste sentido, as manifestações de quarta-feira foram um importante instrumento de pressão sobre o legislativo. Cabe à presidente Dilma aproveitar a pressão popular e continuar a enfrentar os corruptos que estão no governo, pois parece que após a faxina no Ministério dos Transportes e a troca de comando do Ministério do Turismo, a presidente esmoreceu nessa iniciativa. Se ela demonstrar empenho no combate à corrupção, terá o respaldo do movimento que está ganhando corações e mentes pelo Brasil.
Por fim, apesar do imenso avanço que representa o Movimento Contra a Corrupção, é nítido que ele ainda não alcançou segmentos mais humildes da população. Certamente ainda conviveremos com a eleição de maus políticos nas próximas disputas eleitorais, mas que seja em número menor do que o atual. Se o movimento alcançar seus três principais objetivos, estaremos construindo as bases para uma ampla moralização da política e teremos motivação para avançar na ampliação da consciência ética entre o grande contingente de eleitores brasileiros. Sem dúvida, este seria um belo presente que os manifestantes deixariam para o futuro das crianças.
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