Por Joaquim Maia Neto
Apesar de o termo “globalização” estar, de uma maneira geral, associado às mudanças ocorridas no cenário mundial entre o final do século XX e o início do século XXI, é possível afirmar que se refere a um fenômeno cíclico, com picos “globalizadores” ao longo da história. Talvez a primeira grande onda da globalização tenha ocorrido durante o período das grandes navegações, que possibilitaram ligações comerciais entre continentes distantes.
A globalização como a conhecemos hoje tem suas raízes na época imediatamente posterior ao fim da segunda guerra mundial. Os maciços investimentos empreendidos por algumas nações, direcionados à manutenção da máquina de guerra, fincaram as bases do aparato tecnológico que possibilitou a expansão dos mercados, criando a chamada economia-mundo.
Os EUA emergiram da segunda grande guerra como potência econômica. Beneficiados pela concentração da tecnologia e pela capacidade econômica de financiar a reconstrução dos países arrasados pelo conflito, passaram a exercer forte domínio sobre boa parte do mundo, não alcançando a hegemonia global graças à bipolarização decorrente da divisão do poder mundial com a União Soviética. Surgida após a primeira guerra mundial em decorrência da revolução que depôs a monarquia czarista, a União das Repúblicas Socialistas Soviéticas - URSS lutou ao lado dos aliados na segunda guerra, pois havia sido invadida pelas tropas nazistas. Com a derrota do Eixo, coalizão composta, entre outros, pela Alemanha, Itália e Japão, a URSS, que à época já era uma potência industrial, garantiu influência sobre todo o leste europeu. Essa bipolarização deu origem à Guerra Fria, que duraria até 1991.
Após a queda do Muro de Berlim, em 1989, as condições para a rápida expansão capitalista no mundo estavam criadas. A partir de então o poder das corporações passou a ficar cada vez mais evidente em detrimento do poder dos estados nacionais. A adoção por muitos países de modelos econômicos liberais, sob a influência da doutrina implantada por Margaret Thatcher no Reino Unido, aliada ao avanço tecnológico nas comunicações e nos transportes, permitiu o surgimento da “aldeia global”. Estabeleceu-se a divisão internacional do trabalho, por meio da qual as corporações pulverizam etapas da produção de bens em diversos países, garantindo o maior lucro possível. Enquanto no passado a produção industrial se dava na metrópole, que obtinha a matéria prima a partir das colônias, no novo modelo a produção passou a ser feita nos países menos desenvolvidos para garantir menor custo de produção, devido principalmente à mão-de-obra mais barata. A prática muitas vezes leva à exploração desumana dos trabalhadores de países periféricos e garante a disseminação global dos produtos a preços competitivos.
Fonte: http://www.gaia.org.pt/ |
As consequências ambientais da globalização e da implantação da nova ordem mundial do pós-guerra são catastróficas. A crise ambiental que ameaça o futuro do planeta tem sua origem justamente na expansão capitalista promovida pela globalização. Para a economia globalizada continuar crescendo são necessários cada vez mais consumidores, ainda que não consumam sequer o mínimo necessário a uma vida digna. O aumento do consumo por aqueles que já dispõem do necessário para viver é uma necessidade constante, que é estimulada por campanhas publicitárias, mensagens subliminares e por um sistema que valoriza as pessoas pelo seu poder de compra e não pela essência de cada ser.
Planejamento familiar, soluções coletivas para aquisição de bens e serviços (incluindo o transporte coletivo), formas alternativas de produção, estímulo à produção familiar de alimentos, entre outros, contrariam a lógica do mercado global e por isso não são fomentados pelos governos e instituições públicas capturados pelas corporações. Para que essa máquina continue girando é preciso que se disseminem padrões de comportamento altamente consumistas.
Nessa esteira seguem estratégias altamente sofisticadas, como a chamada obsolescência programada, observada com facilidade, por exemplo, no mercado de telefones celulares. Apesar de haver tecnologia disponível para produtos mais sofisticados, os modelos são lançados “a conta-gotas” para estimular o maior consumo. A indústria da moda é outra vertente da estratégia consumista, ditando padrões voláteis que impõem aos seus seguidores a necessidade de comprar novas roupas a cada estação.
As necessárias ações mitigadoras de problemas sociais, como o combate à fome, por exemplo, ou mesmo algumas louváveis ações de inclusão social, muitas vezes ajudam a movimentar o sistema, na medida em que trazem mais consumidores ao mercado. No entanto, medidas que possam distribuir renda mais efetivamente, como tributação progressiva ou uma regulação mais rígida do mercado não são adotadas. Discussões sobre controle populacional são consideradas tabus, sob o pretexto de que o desenvolvimento proporcionado pelo avanço da economia de mercado promove naturalmente o planejamento das famílias.
Fonte: leonamsouza.blogspot.com |
No mundo dominado pelos interesses corporativos a demanda por matéria prima e energia é crescente. Isso resulta em exploração insustentável dos recursos naturais, geração de resíduos em progressão geométrica, poluição e contaminação ambientais crescentes, avanço progressivo sobre áreas naturais, escassez de água, destruição de habitats com consequente redução na biodiversidade, incremento na emissão de gases de efeito estufa, etc..
Paradoxalmente, a ganância desmesurada da globalização capitalista poderá ser seu algoz. As recentes crises que abalaram a economia estadunidense com reflexos que estão sendo sentidos até agora no restante do mundo, especialmente na Europa, demonstram isso. A facilidade que a tecnologia propiciou na área da comunicação, causa e ao mesmo tempo consequência da globalização, promove a gestação de movimentos contrários ao capitalismo selvagem, turbinados pelas redes sociais.
A análise do fenômeno da globalização com alguma profundidade joga por terra as teses conspiratórias contra as ONGs ambientalistas, que atribuem a elas interesses contrários ao desenvolvimento das nações emergentes. A degradação ambiental ocorrida nesses países tem concentrado riqueza nas mãos das corporações transnacionais que compram nossas commodities para produzir bens industrializados de valor muito maior. A estadunidense Cargill é um exemplo didático.
Assim como em qualquer atividade humana, a luta pela conservação ambiental não pode prescindir dos conhecimentos históricos, econômicos e geopolíticos, sob pena de que se cometam erros cruciais de avaliação que acabam levando ao fracasso.
Olá Joaquim,
ResponderExcluirMuito legal seu artigo. Primeiramente pela perspectiva histórica do processo de globalização Acredito que a história é uma ferramenta fenomenal da compreensão dos fatos atuais, e como vc mostrou no artigo, hoje estamos onde estamos, muito, por razões históricas. Também achei bem legal mostrar que a redução do estado está diretamente ligado a crise ambiental. As medidas de austeridade na europa para salvar os bancos mostram que estamos muito longe de um caminho sustentável.
Mais uma vez parabéns pelo artigo!
Abraços
Rafael M. Chiaravalloti
Gosteei muiito do seu textoo, me ajudou num trabalho da escolaa..
ResponderExcluirCara Gabih.
ExcluirFico muito feliz em saber que o "Opinião Sustentável" está ajudando pessoas pelo Brasil afora. Este é um dos objetivos do blog.
Muito obrigado pela leitura e um grande abraço.
Joaquim
Parabéns pelo artigo, não só esclareceu minhas duvidas como também transbordou conhecimento, gostei muito do teu trabalho e estou usando como texto de apoio em um trabalho acadêmico.
ResponderExcluirMais uma vez, meus parabéns...
Muito obrigado, Carolina. Nunca mais tive tempo de tocar o blog e por isso não escrevo mais nele. Mas faço questão de mantê-lo no ar. Que bom que ajudou. Grande abraço.
ExcluirParabéns pelo seu texto, excelente demais!
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