Por Joaquim Maia Neto
Ontem foi realizada a sexta edição da “Hora do Planeta”. O evento, criado pela ONG ambientalista WWF, foi realizado pela primeira vez em 2007 na Austrália e acontece anualmente no último sábado do mês de março.
Durante 60 minutos, entre as 20h30 e as 21h30 no horário local de cada país, cidadãos de todo o mundo são convidados a apagar as luzes como forma de refletir sobre o aquecimento global. Mas qual a relação entre o apagar das luzes e o efeito estufa?
No Brasil há certa dificuldade em se entender essa relação devido às peculiaridades da nossa matriz energética, que é muito diferente quando comparada à média mundial. O gráfico ao lado mostra uma comparação entre a matriz brasileira e a mundial. Enquanto aqui aproximadamente 54,1% da energia utilizada provém da queima de combustíveis fósseis, no mundo a participação desse tipo de energia na matriz chega a 80,3%. Esses percentuais não se referem apenas à energia utilizada para iluminação e nem mesmo apenas à energia elétrica, mas incluem, por exemplo, a energia utilizada nos transportes. Como no Brasil a maior parte da energia elétrica distribuída é proveniente de usinas hidrelétricas, há uma tendência a se ignorar a relação entre iluminação artificial e aquecimento global. Em termos globais, dada a matriz energética mundial, é certo que quanto menos luzes estiverem acesas menos carbono será emitido à atmosfera.
É lógico que uma hora por ano com luzes apagadas não resolverá o problema e nem tampouco irá contribuir em termos percentuais de maneira significativa para a desaceleração do efeito estufa. Mas não é esse o objetivo da hora do planeta. O principal objetivo é fazer com que, por meio de uma ação coordenada mundialmente, pessoas parem o que estão fazendo, saiam da sua rotina e pensem no que pode ser feito para o combate deste que é um dos maiores problemas que a humanidade enfrentará, ou melhor, está enfrentando.
Assim, a crítica quanto à ineficácia da Hora do Planeta sob o aspecto da insignificância da redução de emissões durante estes 60 minutos não procede, pois não é essa a intenção do movimento. Há outras críticas pertinentes que, no meu ponto de vista, não desqualificam a realização do evento. Faço questão de divulgar e participar, pois acho que qualquer ação ambiental, por mínima que seja, ainda que insuficiente, traz algum tipo de resultado positivo, mesmo que seja apenas o despertar em algumas pessoas da reflexão sobre a validade ou não daquela ação. Se a conclusão for pela sua inadequação, ao menos ficará o questionamento sobre o que pode ser feito de maneira mais adequada.
Acho que deveríamos aproveitar a crescente popularização da Hora do Planeta ao longo dos anos para ampliar o seu escopo. Nada impede que em cada localidade o evento seja adaptado às peculiaridades locais. Por exemplo, no Brasil seria interessante que se incluísse, além do apagar das luzes e do desligamento de eletrodomésticos, a não utilização de veículos automotores, pois aqui eles contribuem mais com o efeito estufa do que as luzes. Há localidades brasileiras onde a produção de energia elétrica é feita predominantemente por meio da queima de combustíveis fósseis, mas isso representa um percentual pequeno na realidade do país. Sabemos também que a energia hidrelétrica não é totalmente limpa e que as usinas que geram esse tipo de energia também emitem um pouco de gases do efeito estufa, como metano, por exemplo. Há ainda outros impactos ambientais causados pelas UHEs, mas não há como negar que, no que diz respeito à contribuição ao aquecimento global, elas são melhores do que as termoelétricas movidas a combustíveis fósseis.
Uma importante lição da Hora do Planeta é que não precisamos de toda a energia que estamos consumindo. Nesses sessenta minutos em que ficamos privados de alguns confortos do mundo moderno, percebemos que não foi tão difícil ficar sem alguns deles. Até porque há pouco tempo atrás não os tínhamos. Podemos utilizá-los com menor intensidade, ou ainda dispensá-los, sem que isso nos impeça de viver dignamente. E isso leva a uma reflexão mais profunda. Não são apenas as luzes que precisam ser apagadas. Nosso consumo desenfreado é que precisa urgentemente ser apagado. Nossos padrões atuais são incompatíveis com aquilo que a natureza pode nos oferecer sem se desequilibrar. Não adianta produzir produtos “ecoeficientes” e comprar coisas “ambientalmente corretas” se essas condutas forem utilizadas para acalmar nossas consciências e promover ainda mais consumo.
A crescente demanda por energia e o consequente aumento de emissões de gases do efeito estufa são causados pela lógica capitalista que leva as pessoas a comprar cada vez mais. Se nossos padrões de consumo não mudarem, produzir equipamentos que consomem menos energia, assim como apagar as luzes não serão nada mais do que “enxugar gelo”.
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